Uma voz, muitas vidas

 
A morte de Luiz Mendes é um duro golpe para todos nós botafoguenses que, inconscientemente, acreditamos na imortalidade. Que achamos que sempre vimos o Botafogo jogar e que veremos o Botafogo em campo até depois do fim dos tempos. Até mesmo depois que a gente não estiver mais por aqui.
Sua voz, límpida e segura, acompanhou minha infância, adolescência, a vida adulta, agora a chegada da meia-idade. A cada semana, ouvir Mendes era esquecer a dureza concreta do cotidiano (da escola, do vestibular, da faculdade, do trabalho) e mergulhar num universo de lembranças e de esperanças – porque, aprendi isso desde cedo com o Pereirão, o rádio tem essa capacidade única: nos leva para outros lugares, outros tempos, outras vidas – inclusive as que a gente não viveu.

Por meio das lembranças de Luiz Mendes, eu vi o que eu não pude ver: vi Nilton Santos avançar, vi Garrincha driblar, vi Paulo Cesar Caju provocar, vi  Jairzinho comemorar, vi, enfim,  o mais glorioso Botafogo brilhar.
Não só isso, claro. Com menos emoção mas igual admiração, me encantei ao vê-lo relembrar os grandes jogos das mais inesquecíveis Copas do Mundo,  um Brasil que realmente tinha amor à camisa, um Brasil que dava orgulho, um Brasil pelo qual valia a pena torcer.
E, mais, é na serenidade de sábios como Luiz Mendes que me espelho para tentar entender o motivo de tanta paixão, tanto sofrimento, tanta ansiedade, tanta emoção pelo destino de um time. Um destino em que nada posso interferir, em que sou refém de pés, mãos, corações, cérebros e apitos alheios.
Ainda não consegui. Mas, por conta do exemplo do Luiz Mendes e de outros grandes alvinegros que carrego nas lembranças, no sangue e no coração, eu continuarei tentando. Um dia chegarei lá.
Enquanto isso, só tenho mais uma coisa a dizer:
Obrigado, muito obrigado, Luiz Mendes, por me ajudar a conhecer e a escrever a minha história.